segunda-feira, 25 de julho de 2011

Quando vamos deixar o "complexo de vira-lata"?

Nosso complexo de vila-lata é imenso.  Sempre ouço ou leio coisas do tipo: no dia em que o Brasil for igual aos Estados Unidos nós estaremos bem; ou, na Europa sim... Se o Brasil aprendesse um pouco mais com os europeus; Brasil, país cheio de corrupção e gente sem escrúpulo. Alguns “especialistas”, jornalistas e outros tantos, teimam em mostrar o Brasil como sendo um país promotor de fracassos e realizador de ações absolutamente equivocadas.

Por que será que os Estados Unidos e os países europeus são sempre considerados lugares fantásticos, e o Brasil, um simples paisinho de merda? Será que nossos políticos são tão piores do que os políticos dos países ricos?

Recentemente Jô Soares foi entrevistar o filósofo Renato Janine Ribeiro e fez o que comumente a elite divulga e vende como verdade absoluta. Lá pelas tantas, Renato Janine Ribeiro, falando sobre a importância de não se ser passivo diante das decisões, sejam elas quais forem, porque para os gregos, os passivos e individualistas, eram idiotas. Jô Soares então, pergunta se um bom síndico é melhor do que um mal deputado, e em uníssono com o próprio Janine, reconhece que um “político” ruim é “pior que tudo”. Essa óbvia constatação é seguida por uma reflexão de Janine: “um mau político faz um estrago tremendo”, que continua: “temos isso (mau político) no Brasil, mas temos isso no mundo todo também...” Nesse momento, Jô Soares tenta corroborar com esse raciocínio, destacando os políticos brasileiros como piores do que os políticos dos países ricos. Ele tenta fazer isso em tom de brincadeira, mas, Janine não embarca na brincadeira e explica que antigamente achava-se que corrupção era coisa de país subdesenvolvido. E continua, “quando agente começa a ver o volume de corrupção dum ex-presidente da França, o Chirac; do que é denunciado na Espanha, na Inglaterra agora, Itália nem se fala; o vice-presidente do Bush fez toda aquela negociata no Iraque... Então, a sensação da corrupção é bem maior hoje no mundo todo, porque naquele tempo o que se dizia era: corrupção tem em países da África, têm em países da América Latina, mas no mundo desenvolvido os países resolveram isso. Sem suportar tais verdades Jô Soares pontua: ... mas peraê, mas a... não há o problema, por exemplo, da impunidade, que é diferente? Ao que Janine responde: “Chirac ta impune, o vice do Bush ta impune, o Berlusconi já é Primeiro Ministro, acho, pela terceira vez...” nesse momento, Jô Soares percebendo a bobagem que falou, destacou o fato de Berlusconi não ser um ilibado exemplo de comportamento, nem na política, nem na vida privada.

Assistam a entrevista toda, ou somente até os 04min e 20 segundos. Após, leiam o texto escrito por nosso ex-ministro das Relações Exteriores do governo Lula, Celso Amorim.




O complexo de vira-lata

Por Celso Amorim, na CartaCapital

Até os jornais brasileiros tiveram de noticiar. Uma força-tarefa criada pelo Conselho de Relações Exteriores, organização estreitamente ligada ao establishment político/intelectual/empresarial dos Estados Unidos, acaba de publicar um relatório exclusivamente dedicado ao Brasil, -pontuado de elogios e manifestações de respeito e consideração. Fizeram parte da força-tarefa um ex-ministro da Energia, um ex-subsecretário de Estado e personalidades destacadas do mundo acadêmico e empresarial, além de integrantes de think tanks, homens e mulheres de alto conceito, muitos dos quais estiveram em governos norte-americanos, tanto democratas quanto republicanos. O texto do relatório abarca cerca de 80 páginas, se descontarmos as notas biográficas dos integrantes da comissão, o índice, agradecimentos etc. Nelas são analisados vários aspectos da economia, da evolução sociopolítica e do relacionamento externo do Brasil, com natural ênfase nas relações com os EUA. Vou ater-me aqui apenas àqueles aspectos que dizem respeito fundamentalmente ao nosso relacionamento internacional.

Logo na introdução, ao justificar a escolha do Brasil como foco do considerável esforço de pesquisa e reflexão colocado no empreendimento, os autores assinalam: “O Brasil é e será uma força integral na evolução de um mundo multipolar”. E segue, no resumo das conclusões, que vêm detalhadas nos capítulos subsequentes: “A Força Tarefa (em maiúscula no original) recomenda que os responsáveis pelas políticas (policy makers) dos Estados Unidos reconheçam a posição do Brasil como um ator global”. Em virtude da ascensão do Brasil, os autores consideram que é preciso que os EUA alterem sua visão da região como um todo e busquem uma relação conosco que seja “mais ampla e mais madura”. Em recomendação dirigida aos dois países, pregam que a cooperação e “as inevitáveis discordâncias sejam tratadas com respeito e tolerância”. Chegam mesmo a dizer, para provável espanto dos nossos “especialistas” – aqueles que são geralmente convocados pela grande mídia para “explicar” os fracassos da política externa brasileira dos últimos anos – que os EUA deverão ajustar-se (sic) a um Brasil mais afirmativo e independente.

Todos esses raciocínios e constatações desembocam em duas recomendações práticas. Por um lado, o relatório sugere que tanto no Departamento de Estado quanto no poderoso Conselho de Segurança Nacional se proceda a reformas institucionais que deem mais foco ao Brasil, distinguindo-o do contexto regional. Por outro (que surpresa para os céticos de plantão!), a força-tarefa “recomenda que a administração Obama endosse plenamente o Brasil como um membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas. É curioso notar que mesmo aqueles que expressaram uma opinião discordante e defenderam o apoio morno que Obama estendeu ao Brasil durante sua recente visita sentiram necessidade de justificar essa posição de uma forma peculiar. Talvez de modo não totalmente sincero, mas de qualquer forma significativo (a hipocrisia, segundo a lição de La Rochefoucault, é a homenagem que o vício paga à virtude), alegam que seria necessária uma preparação prévia ao anúncio de apoio tanto junto a países da região quanto junto ao Congresso. Esse argumento foi, aliás, demolido por David Rothkopf na versão eletrônica da revista Foreign Policy um dia depois da divulgação do relatório. E o empenho em não parecerem meros espíritos de porco leva essas vozes discordantes a afirmar que “a ausência de uma preparação prévia adequada pode prejudicar o êxito do apoio norte-americano ao pleito do Brasil de um posto permanente (no Conselho de Segurança)”.

Seguem-se, ao longo do texto, comentários detalhados sobre a atuação do Brasil em foros multilaterais, da OMC à Conferência do Clima, passando pela criação da Unasul, com referências bem embasadas sobre o Ibas, o BRICS, iniciativas em relação à África e aos países árabes. Mesmo em relação ao Oriente Médio, questão em que a força dos lobbies se faz sentir mesmo no mais independente dos think tanks, as reservas quanto à atuação do Brasil são apresentadas do ponto de vista de um suposto interesse em evitar diluir nossas credenciais para negociar outros itens da agenda internacional. Também nesse caso houve uma “opinião discordante”, que defendeu maior proatividade do Brasil na conturbada região.
Em resumo, mesmo assinalando algumas diferenças que o relatório recomenda sejam tratadas com respeito e tolerância, que abismo entre a visão dos insuspeitos membros da comissão do conselho norte-americanos- e aquela defendida por parte da nossa elite, que insiste em ver o Brasil como um país pequeno (ou, no máximo, para usar o conceito empregado por alguns especialistas, “médio”), que não deve se atrever a contrariar a superpotência remanescente ou se meter em assuntos que não são de sua alçada ou estão além da sua capacidade. Como se a Paz mundial não fosse do nosso interesse ou nada pudéssemos fazer para ajudar a mantê-la ou obtê-la.

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