sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Os humanos Lula e Nelson Mandela

(Comentário ao artigo: “Lula es como Mandela” publicado no El País)

Mandela é humano, Lula é humano, outros tantos grandes exemplos, não foram exemplo em tudo, mas  foram, e ainda são, exemplos de humanidade. Lula é um homem, um estadista, um humano fantástico. Fez um governo em muitos aspectos dos melhores que o Brasil, minha terra, meu país, já viu. É claro que houveram erros, estranho seria se não tivessem existido.

Não estou fazendo apologia à corrupção, pelo contrario, a detesto! O que estou tentando deixar claro é que ainda encontra-se incrustado em nosso DNA social uma coisa chamada “jeitinho brasileiro” que caracteriza-se em diversos setores da sociedade, como uma coisa aceitável.

Numa sociedade como a nossa que enfrentou a inepta arrogância humana travestida de ditadura, que aceitou - e ainda aceita - coronelismo, política fisiológica, leis ultrapassadas, líderes preocupados em se manter no poder, política partidária e não um projeto de país, preocupações pessoais, egocentrismo e uma educação convencional, ou mesmo familiar, das piores. Não seria - e não será - modificada em vinte ou trinta anos. É ingenuidade da nossa parte acreditarmos que culpar Lula, ou mesmo FHC, por qualquer corrupção que tenha havido em ambos os governos, é a melhor forma de construirmos uma sociedade mais justa. Devemos criticar sempre a reação desses governos diante de uma denúncia ou diante de um ato de corrupção. E pelo que me consta, Lula foi mais efetivo nessa questão.

A polícia federal, o ministério público, o Supremo Tribunal Federal trabalharam sem impedimentos. A Polícia Federal cumpriu mandados de prisão (entre os presos figuraram até governadores e prefeitos) de forma exemplar e investigou pessoas das mais diversas camadas da sociedade. Não houve qualquer sinalização contraria por parte do Governo Federal, ainda que alguns investigados fossem da base governista, ou mesmo do partido do presidente.

Tratou-se com seriedade temas de imensa importância. Não ficamos presos somente a um tema como aconteceram em outros tantos governos. Embora vivamos esse momento de globalização e de perda da identidade de boa parte da humanidade – principalmente em países mais pobres – o Brasil, um pouco com FHC e muito com Lula, transformou-se em um ator com proeminência gigantesca no cenário mundial.

Como Nelson Mandela (que recentemente aprovou a publicação do livro: “conversas que tive comigo” em que é apresentado como humano e como exemplo de que é possível existir outros como ele) Lula deixa-nos a lição de que é possível. Para mim, FHC fez um bom governo. Contudo, ele representou um governo comum, uma continuação do governo de elite que, com o conhecimento, poderia salvar a população da sua própria ignorância. Lula fez um governo de continuidade, de ampliação, de humanização, de empreendedorismo, de ajuda aos menos favorecidos, de povão para povão. Lula mostrou, como Nelson Mandela, que é possível. É possível sermos humanos, cometermos erros, sermos pequenos em alguns momentos, e mesmo assim, transformar uma nação, uma população e contribuir para mudanças significativas na visão da humanidade.

Deveríamos encarar como um privilégio gigantesco estarmos vivos durante essas mudanças. Sou parte da História e acredito que Lula, Mandela, Dilma, Rigoberta Machú, Aung San Suu Kyi, entre outros, são inspiração para minha vida. Todos eles são humanos, e outros tantos que já morreram, que não foram perfeitos em tudo, também podem – e até devem – serem admirados por não terem fracassado diante da história. Concluo, em homenagem a Lula, com o poema genial de Fernando Pessoa. Não precisamos de exemplos perfeitos, precisamos de humanos extraordinários. (Viva o extraordinário Lula!)

Poema em linha reta
Nunca conheci quem tivesse levado porrada.
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo.


E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil,
Eu tantas vezes irrespondivelmente parasita,
Indesculpavelmente sujo,
Eu, que tantas vezes não tenho tido paciência para tomar banho,
Eu, que tantas vezes tenho sido ridículo, absurdo,
Que tenho enrolado os pés publicamente nos tapetes das etiquetas,
Que tenho sido grotesco, mesquinho, submisso e arrogante,
Que tenho sofrido enxovalhos e calado,
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda;
Eu, que tenho sido cômico às criadas de hotel,
Eu, que tenho sentido o piscar de olhos dos moços de fretes,
Eu, que tenho feito vergonhas financeiras, pedido emprestado sem pagar,
Eu, que, quando a hora do soco surgiu, me tenho agachado
Para fora da possibilidade do soco;
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas,
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo.


Toda a gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho,
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...


Quem me dera ouvir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,


Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?


Então sou só eu que é vil e errôneo nesta terra?

(Fernando Pessoa)


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